Textos de Alberto Moreira Ferreira
Não tenho mais nada, levem 
A minha solidão a minha dor 
E digo-vos face a face

Minto-vos quando vos dou os
Meus sonhos, o meu coração 
Somente ao meu amor...

Devolvo-vos o que recebi
O que encontrei além disso 
Pela sorte que procurei é 
Apenas para o meu amor 

Vamos; 
E desapareçam da minha vista
Antes que o amor acabe
Caías sempre no mesmo buraco
No mesmo lugar
E aquele lugar repetia-se em todos os lugares
Era sempre o mesmo buraco no mesmo lugar
Fosse em que lugar fosse
Sempre o mesmo buraco no mesmo lugar
Pronto a esmurrar-te os joelhos como 
A cruz creio sedento de te comer o corpo todo
E num 
Estado de alerta permanente esvaías-te e gelavas 
Durante a fuga acabavas sempre no mesmo lugar
Aterrorizado entre dentes de ratos mortos
Cobre-me o prado e penso ainda que o engano sou
Eu, já não quero apagar a tela
Mas continuo a matar o astro
Que me embala adormece e acorda
Comigo a sonhar um doce, alto, de ovos
A doçura do amanhecer e... E;
Que importa o i se os ratos aperram armas rangendo
E tu, não baixas a guarda e a vida 
Vai ficando para 
Depois naquele lugar
Tinha regiões de baixa pressão atmosférica 
O céu anoitecia e a imagem que tinha do horizonte aumentava
Era uma falsa imagem da tarde a origem da imobilidade
Nessa depressão atmosférica permanecia nas cordas
E nesse amontoado de escuridão ficam 
Os pés amarrados, dias e dias sem ver nascer o sol
Era todo infinitamente noite triste, enfim, onde um louco consegue ver alguma beleza
A escuridão é como a teia que se instala 
Está dentro de ti, teces a teia e alimentas-te
Um dia és tu a mosca pendurada na teia
E em vez de te amares és comido como um cego
Eu luz sou grato à sombra que desamarrou a minha pena 
Os fios delgados e retorcidos de matéria orgânica 
Prolongamento filiforme
Providos de raiz de glândulas sebáceas crescidos na pele 
Uns vão caindo, outros embranquecendo
Fomos pequenos crescemos
Passámos do último quarto à conjunção 
E voltamos àquele dia em que não éramos 
Antes disso ganhamos novos olhos e estes
Ou distorcem por omissão 
Ou adaptam-se e libertam-se da loucura
Como o valente nas condições possíveis 
Com a claridade 
Dos que amam dos que sofrem
Os fios delgados e retorcidos...
Os homens são crianças primitivas, são felinos, são vazios de ponto cheio, são luz e sombra, um perigo quando esta desaparece.
Tinha a bússola sem agulha, eu
Era um barco à deriva sem velas
Pensei ser o eterno filho da noite
O canino de konoha sem amor

Eu não preciso do calor da lua
Eu não vivo no covil da raposa
Não olhes para mim, antes a íris 
No fim à orfandade dos céus

E, pensei depois: sou o dissidente
O calor da lua está na minha cabeça 
Não importa a cor mas a sua raiz
Movimento no quintal
Diriam que é tudo vida
Galos velhos como cães 
Infligindo dor por ração 
Invisível à luz má do dia
Via nuvens moverem-se
Consoante o tempo, e as bichas
Os cães sempre pela trela
Agarrada às partículas 
De pose e no momento oportuno 
A ração como garantia
E sempre um silêncio conivente 
Tudo tão azul e cinzento 
Também ardo do apodrecimento 
Pestes, excremento, febre pés de
Mortos, a minha janela a cismar
Parece púrpura, o vermelho sofre
E é sempre tudo tão azul sempre 
Tudo tão cinzento 
Há uma outra aldeia para lá da casa da fonte pequena 
O meu gato desapareceu 
E nem me avisou, talvez 
Tenha dado sinais disso
E eu ocupado subjugado
Hoje não pesquei um 
Único peixe para o almoço 
A coruja não a chama
O anel não tira os olhos 
De um possível milagre
E a lua de mel lá longe 
Cara árvore, o mocho
Prestes a ceder
O laço metamorfoseia
Dá lugar ao lago
Uma velha tecedeira de malha 
Intromete-se
Com a sua mão de sapo ofusca 
O violeta para tortura fracasso 
E dor, a
Rosa vermelha desaparece e tu
Temes a erva abominas a palha
E os impostos 
Que se pagam para morrer
Tenho tentado amar os animais
Úteis inúteis, a definição de utilidade 
Social é perniciosa, e nesta terra areosa
De representações, é-me difícil 
Estabelecer empatia com pedras 
De toque, em síntese, com a força tendo
Em conta a finitude de tudo e o eu
Suspenso por razões, que, não alargo 
E tento, ainda assim tento, tento e sinto
-me sempre a cair. E como amar quem
Te leva ao cemitério? Afinal de contas
É mais difícil que desejar a travessia 
Ou amar o canto das árvores 
Esse sim, útil ao espírito que
Me cai e faz cair, muito mais 
útil que um tratado um crime um... 
Com retorno garantido entre animais
Desarruma-me e faz- me sentir
O eco dos teus cabelos soltos
Mais que a rotina dos caminhos

Desarruma-me todo com o teu
Vintage guardado e deixa que
O dia redondo comece de novo

Na folhas de um livro de amor. Ó 
Dos pontos cardeais desarruma-me 
A agulha de marear
Entre o amarelo e o amarelo prefiro o amarelo. Entre viver e viver prefiro viver. Entre morrer e morrer prefiro morrer. Entre o tom e o tom prefiro o tom
Para mim a poesia não se apresenta a concurso, para mim a poesia não compete, para mim a poesia é uma criação da existência pura urbana e selvagem. Para mim a poesia é natural. Eu nasci condenado
Esta noite tenho tanta vontade 
De me perder e encontrar
De olhos fechados a tua nascente 

Perfume desfilando tal um sonho
Tão certo incerto como o tempo
Demolindo as paredes fantasmas

Desta casa que me arruma
Das tuas horas, do vento noturno
E do desejo de adormecer
Pelo prazer de um momento de amor

Esta noite tenho tanta vontade 
De me perder e escapar 
Entre nuvens a cada osso 
Vivo que vai teimando teimando em ficar
O tempo perdoa todos, inclusive os que não se perdoam, o tempo abraça a vida e o dia de amanhã
Embrulho-me com sementes de neve
Protegendo-me antes que a tempestade
Desabe a serra no topo do meu tronco
E, o vento gela, e que, a chuva ilustre
E não me traga areia caída do céu. Ai
Ai neve neve ai neve és tão quentinha

É desmotivador e até violento ver e ouvir sempre as mesmas coisas, a mesma moral os mesmos cordeiros sempre de rapina sempre as mesmas escamas circulares o mesmo choro o mesmo choro memória de peixe sempre a mesma demência e sempre as mesmas línguas
Desapertei-te o botão, e tu
Nem me conseguiste dizer
Nada, e nem o teu rosto
Toquei suavemente além 
Do ecrã onde estou agora
Que é como a forca por onde 
Me fico às vezes
Desamado, absorto 
A minha boca fechada
da cor do teu batom 
desvive e nem é da cor 
     do esquecimento
Sou um automóvel com o nariz socado
E desde o embate, tudo cheira a morte
Como se o coração vivo tivesse morrido
E bate para amar bate por se perder 
A flor do sol tem na sua própria dor
A distância dos amores que morrem
Minha alma esgota-se a cada dia mais
Na gordura da solidão. Era preciso um
Sonho para não morrer. Ela é um sonho 
Mas a doença é de doidos e eu tenho
O coração gelado, o nariz
Socado e não tarda
A noite é o meu destino
O globo terrestre continua arcaico, retrógado, incapaz de se libertar das paredes, do setor primário, dos obstáculos impeditivos da boa circulação, empossa o popular desinveste na lavra e o populismo, é um boneco inanimado míope animado pelo avesso à mudança companheira do desenvolvimento. O formato esférico da minha querida é tanto maior e um pássaro vê-se tantas vezes a desviver nesta terra de lama granito asfalto laranjas e figos secos, ubuesco, figas e figuras vãs que por vezes, sinto-me odiar a terra que amo.
Vivemos sentados no bus, no ar
Balançando na rede no alpendre 
Como pavões agitados que a máquina 
Deu à luz pelo escuro dos escravos
Feitos a chicote para crescer a barriga
De grandes deuses mortos na cozinha

Nas sepulturas mostram a beleza 
Do metal retocado no photo editor
Sem as lágrima de Mi-oh island
Portanto de que me vale morrer
Se morria como vou morrer no meio
Da multidão amargamente sozinho
Quero escrever e não 
Quero escrever. Não,
Eu não quero escrever

Nunca sei o que dizer
Resgato o amor
Ou perpétuo os mortos 

Na escuridão da folha branca
Levo água e flores ao cemitério 
Qual a fronteira entre a casa
E a casa

Alguém se interessa pela árvore?
Vou ser um criminoso, talvez um
Pintor se interesse pelo sentido
Oposto
Sim fui eu inocente quem matou
As cores e o tempo matou o gato
Agora ao preto haurido das montanhas 
Resta o silêncio dos vales
O lençol é como a noite
Sem uma gota de sangue
Há muito perdida 

O infinito está longe
E a casa é fria, pela
Primeira vez admito

Que não há amor em mim
E odeio pensar que o amor
Foi inventado pela assombração 

Pelas casas escondidas
Que não me odeiam 
E pelos bêbados ao espelho 
Que me vão odiar 

E ninguém tem nada com isso
A minha alma vacila
Aparece desaparece
O corpo mais imóvel
Um barco tal outros 

Num lugar como outros
A bordo o sentido desliza
Não há planos, estou calmo
O mar frio e o azul íngreme 

No limbo não há chuva
Ondas luzes poesia querida 
Poderia haver um cão e não 
Há, há uma imobilidade 

Nem mesmo vento, não há anjos
Nem bruxas, poderia haver deuses
Que não existem e não há, nem
É deus que procuro, a escuridão 
Não é ainda nascida

Há uma cadeira, uma alma distante
Uma questão: posso ir embora; nem
mais nem menos

Da minha cinta até ao pescoço ou das pernas para baixo é que a morte não se vem, eu não gosto de nuvens e sou feliz apenas com o céu estrelado.

O amor que não te mata destrói-te.
Passageiro da cascata 
Pedaço de um porto
Cria da nascente, desagua
Vai embora

No riacho viu-se perto 
No rio mais perto 
Afasta-se aproxima-se 
A cada ir mais perto mais 

Longe - Entardece 
Anoitece Amanhece
Pássaro da levada, gentil
-mente Mar desagua
Vai embora
Eu não te quero nem te desejo
Enfim, reprimo a respiração 
Para que não caia porque a
Sensualidade dos teus gestos 

Se te tivesse mulher feliz
O sabor desse orgasmo que
Apaga e acende a luz...
Paixão, entre morrer e não morrer 

Trocava o corpo pela memória 
De fechar a porta para nunca mais
Que raio de fogo belo me saíste 
Não são sombras mas cemitérios 
Escondidos dando largas aos seus
Mecanismos do inconsciente 
Como chamas que acabam em ti

Não é sombra o perfil anónimo de jazz
Será o morto encoberto sem confiança 
Antiga videira seca num excesso de azul
É tudo veneno de siluro sem paixão 

Não há sombras sem cara porque
Todas as árvores têm um rosto 
E tu sombra - eu não te sabia curva
Sem morreres de amor 
Às vezes sou um peixe fora da árvore 
E, é estranho ver-me na água sempre 
Só na luz negra a cantar entre morais amorais 
Algas pedras areia e o mais terrível dos males
Se o mar não fosse cinzento os peixes 
Não boiavam na maré cheia
Não pensas que se parte
E parte 
Que se malgasta desgasta
Depois
Desaprende como o amor
Como o Douro esquecido
Do seu leito. Não pensas 
Que se parte e parte e não 
Parte
Pregaste-me muitas partidas 
Mas a pior foi quando abandonaste
O bebé no meio da multidão 
Sem saber andar, esqueceste
De o ensinar ou também não sabias
Nem soubeste que ninguém o viu ou 
Que, se alguém o viu olhou para o
Outro lado. O bebé ainda hoje vive
E não sabe se sabe
Procura é dedicado humilde e confia
Não me vais pregar outra partida 
Pois não 
Não ponhas a vista no verde Olha a lacuna, vê o vermelho Remeter o azul ao amarelo Porque é o sítio de origem
Eu nasci coxo, dias depois 
Fui à Disneyland 
Porque pensava que era grande

Comi batatas fritas e o dia 
Anoiteceu 
Um dia submergi num monte

Ossos das bandeiras dos ladrões
Nem sempre uma borboleta pinta
À janela, pensei deitar-me

Na noite oitenta e oito, pensei
No oito, no triste alegre
E o céu não tinha reparo 

Foi aí que pensei estrelar um ovo
Creio que não sei estrelar um ovo 
Um coxo não é diferente duma noite

Eu espero sempre um sol bom
Que me ajude a escamar
Aí abro a torneira e deixo correr
Nunca consigo apertar o laço 
Os navios nos teus lábios 
Sabes de todos os cemitérios onde morri

Contei-te em particular das conquistas
Da cidade antiga, talvez tenha exagerado 
E escondido o tiro no escuro

Eu contava-te dos pássaros do sol 
Das colheres e nunca te falei da negra 
Escuridão quando só tu entravas

Nos meus sonhos no cesto onde chocava
Sabendo do mundo velado
Obsceno por estares casada com ele

E qual o objectivo de um passarinho 
Um pássaro morto não é um porco
É mais uma criança e tem somente na ideia 

A ideia de beleza o encanto para dormir
E acordar naturalmente noutro dia
Será das nuvens do cavalo do som

Do mar no pulmão junto ao coração 

 O que interessa ao pássaro o mundo onde poucas vezes põe os pés. Não direi nada mas pouco. Prendada de visão periférica a pomba brava pousa no chão e bica a cada centímetro uma migalha, o ágil falcão dotado da sua visão central isento de medo durante o gracioso e veloz voo retilíneo caça no caminho. O lobo ibérico ama as liberdades e o ato do amor, com a sua cor topázio voa como a águia e não se interessa pelo mundo conspurcado das ovelhas. Quando venho à terra sinto-me um predador e o mau não é a rosa o meu amor meus amores

Um pássaro sem mundo tem todos os mundos e vai aonde quer
Aqui tão longe, aqui tão preto


O pardal pousa, pousa vai
Anda de galho em galho
Ele procura a esperança
Quer  nascer,  aquece-se
O eco do seu pio selvagem
Tsip com ou sem o assobio
Arrastado com ou sem o
Trilo final tee-teeooo
E'e'e'e'e teeooo, teeee
Diz-te que morreste
Que morremos após
Depois
De termos enfrentado
Limites, dias ruidosos
As ondas das estrelas
A consciência da estação
Dura do verão na voz das freiras
A boca da deusa da erva fruta e
Perfume de nariz de cheiro ruim
Pois no fim do verão ora nenhum 
Sol nenhuma flor podem viver
Depois de seres feliz os mortos
Caídos na terra levam a mão
À boca, a tua felicidade acordou
A inveja do teu irmão, o pardal
O passer domesticus não se veste
Da urbanidade do beija flor amor
E na mão exangue onde outrora
A excelência
...
Enfim, embora a escuridão
Seja dos mortos a desilusão gela
E nós morremos no elevador